quinta-feira, 16 de julho de 2009

ARREPENDA-SE PELA MANHÃ



Se espaço e tempo, como os sábios dizem,
São coisas que não podem ser,
A mosca que só vive por um dia
Viveu tanto quanto nós.
Mas que nos deixem viver enquanto ainda nós podemos,
Enquanto o amor e a vida são livres,
Pois o tempo é o tempo, e veloz se distancia,
Embora os sábios o desmintam.
As flores que te enviei quando o rocio
Estremecia sobre a vinha
Murcharam antes que a abelha voasse
Para sangrar a madressilva.
Mas que nos deixem as colher ainda
Sem lamentar sua agonia,
E embora sejam poucas as flores da vida
Deixêmo-las ao menos ser divinas.


T.S.Elliot (03.06.1907)



(Foto de Maria Helena Oliveira)



Possuo uma natureza meio caramuja. Se me enamoro, a tendência é ficar acomodado, em casa, só fazendo tudo com ela.
É certo que assim como o papai, nesses momentos me afasto dos amigos, praticamente nem os vejo. Talvez pudesse mudar isso.
Ou seja, não é comum que, namorando, eu esteja em um happy-hour com os amigos, pois que o relacionamento me absorve, só consigo viver dentro dele, tal qual o caramujo em sua casca. Não é saudável, leva-me rapidamente à exaustão.

Quanto mais tempo dura uma relação, mais ela lança as suas raízes no chão. Acontece que nem sempre o chão está preparado para receber essas raízes.
Quando se atinge uma determinada idade, a que chamamos cruelmente de maturidade, sofremos muito em nossas relações o fenômeno da superpopulação. De repente, não esta
mos aqui tratando apenas de mim e você, mas de mim, de você, de meus filhos, dos seus, a minha família ou a sua, e até agregados que vão se acoplando e parasitando em nossas vidas. O amor se torna, então, absolutamente complexo e sobrecarregado.



E aí nós temos que enfrentar uma contradição atroz: é que, com a idade, nos tornamos invariavelmente (a não ser que sejamos meio apatetados) mais amigos da reflexão, e do silêncio. Queremos usufruir um pouco da tranquilidade que custamos tanto trabalho em nossas vidas a conquistar.
Não é que não queiramos, vez em quando, o agito. É claro que queremos. Mas queremos ser senhores de nossos agitos, não escravos dos agitos dos outros. Queremos fazer o nosso próprio barulhos, nós temos o direito a isso, não queremos ter que escutar apenas o barulho d
os outros.
E é por isso que o casamento para os "solteirões" às vezes é difícil. É que eles acabam se casando com gente demais. É injusto.





E por isso, ele tende a ser resolvido em momentos de fraqueza. Vivemos sob a égide da razão, é a ela que pedimos socorro. Se pedirmos a ela aconselhamento para abandonarmos a nossa pacata e tranquila vida para nos tumultuarmos em uma relação, digamos, superpopulosa, como faremos, o que dirá a razão? É por isso que a maior companheira da decisão de casar-se mais velho não é a razão, mas a solidão.
Amor, depois de determinada circunstância, é bobagem.
Melhor pensar ser possível acontecerem coisas novas em nossas vidas. Aos 47, seria assim tão difícil? É claro que não. Daí vem o melhor sabor da vida de agora.
Melhor é continuarmos a fazer mais e mais amigos para os nossos filhos jovens (que são precisamente os filhos daqueles com os quais nos relacionamos). O que não fazemos por nossos filhos? Não é a mesma coisa, muita atenção nisso, que fazermos mais filhos com nossos amigos...
Não de
vemos, portanto, permitir que um relacionamento se desgaste. Burrice isso.
Ninguém suporta, ninguém merec
e, um relacionamento desgastado. Antes de qualquer coisa, é chato demais! Depois se torna desrespeitoso, escatológico, monossilábico, poligâmico e rancoroso.
Devemos sair de um relaciona
mento como um craque deveria sair de sua carreira no futebol: no auge. No orgasmo, no gol.
É melhor para a saúde e a paciência de todos. Até mesmo das crianças, se as há. Aliás, nos tempos hodiernos, tenho a certeza de que elas estão bem mais preparadas para lidar com separações e perdas que seus pais. Elas foram treinadas para isso.

"Quando estamos apaixonados, começamos a decepcionar a nós mesmos e terminamos decepcionando os outros. É o que as pessoas chamam de amor romântico."

Oscar Wilde

Amor
é bobagem.

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À noite, a minha cabeça parece somente existir para processar dificuldades, problemas. Já perceberam como tudo é desproporcionalmente maior à noite? E de olhos fechados? As dúvidas, as dívidas, os medos, as frustrações, as angústias...o silêncio da noite amplifica e reverbera o barulho que essas sensações fazem em nossa alma.
Daí poder entender melhor o que é o poder, de fato, de poder dormir em paz. Dormi
r em paz é ser recompensado pelo esforço que fazemos em nossos caminhos despertos. Faça de forma destemida o bem para a sua existência, sem prejudicar a dos outros. Terás em troca uma boa noite de sono.
Só não deixe para fazer de noite o seguinte: arrepender-se.
Arrependa-se sempre de dia, de preferência ainda pela manhã.


"O silêncio é um tumulto".
Machado de Assis


Um comentário:

Anônimo disse...

eu, as vezes, me arrependo de ter nascido.